quarta-feira, 14 de maio de 2008

Maio de 68: Há 40 anos, todo o apoio dos estudantes ao proletariado, e vice-versa


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Estudantes em frente fábrica da Renault prestam apoio e solidariedade
aos operários que ocuparam a fabrica em uma enorme greve

Durante a ocupação estudantil que tomou de assalto a Universidade de Paris no final do mês de maio de 1968, quem passasse pelo Quartier Latin podia ver, nos muros da eminente instituição, cartazes e murais que enunciavam o que se passava na capital francesa.

O episódio da ocupação da universidade, na época apelidada de Sorbonne — hoje, o termo é usado para designar suas várias instituições —, foi apenas um entre tantos do turbilhão de luminosos acontecimentos daquele mês, e ficou conhecido como "Soviet" da Sorbonne. A forma como se deu a ocupação não costuma ser muito lembrada quando se fala do Maio de 68. Principalmente quando quem fala é a burguesia e seus porta-vozes, interessados em enterrar a memória genuína sobre o que de fato aconteceu naquele período, em Paris e no mundo.

As exclamações exibidas nas ruas evidenciavam, para além de palavras de ordem, uma profunda consciência revolucionária: "Recusamos o papel que nos foi designado, não seremos treinados como cães policiais", "Com os estudantes, contra a ordem".

Houve o célebre cartaz que denunciava as tentativas de neutralizar a força das massas, comparando o reformismo a uma tentativa de sedar o povo com clorofórmio. Um outro, igualmente imortal, mostrava a palavra "capital" sendo esmagada por um martelo, símbolo do operariado.

Os estudantes de então atualizaram uma famosa frase do filósofo iluminista Voltaire — frase que se tornou uma espécie de lema das revoluções burguesas do século XVIII. Não se tratava mais de gritar que o mundo só seria livre quando o último rei fosse enforcado com as tripas do último padre. Naquele momento, a compreensão era aquela expressada nos murais e cartazes espalhados por Paris: "A humanidade só será livre quando o último capitalista for enforcado com as tripas do último burocrata".

O conteúdo desta criatividade politizada e combativa extravasada pelos estudantes parisienses revela que a série de acontecimentos que ficaram conhecidos como o Maio de 68 foi de natureza anti-capitalista. Mais do que isto, o Maio de 68 foi um momento histórico de encontro solidário e luta comum da juventude e do proletariado, unidos contra as instituições burguesas.

Além dos murais e cartazes políticos e agitacionais, naquele mês, naquele ano, dentro e fora dos muros da Universidade de Paris, foram fixados grandes painéis informativos sobre quais fábricas iam sendo ocupadas pelos operários franceses. Os estudantes compreendiam o protagonismo do proletariado na revolução que almejavam e, com entusiasmo, eram solidários às vitórias alcançadas pelos trabalhadores contra seus patrões.

Houve inclusive uma grande passeata que saiu da Universidade de Paris rumo à Renault, no subúrbio da cidade, a fim de cumprimentar os operários que haviam tomado as instalações daquela fábrica de automóveis. A idéia dos estudantes era prestar apoio à luta contra os capitalistas e contra a opressão do Estado burguês.

Em uma grande praça situada à frente da fábrica, os estudantes gritavam: "As fábricas aos trabalhadores!". Os trabalhadores respondiam: "A Sorbonne aos estudantes!".

A união de forças entre o proletariado e a juventude é algo fundamental para o processo revolucionário, e o exemplo dos braços dados entre os estudantes e os trabalhadores franceses no Maio de 68 é um dos legados mais importantes deixados pelos protagonistas daqueles movimentos de natureza anti-capitalista — e eminentemente comunistas.

A reação perdura, até hoje

Sim, o Maio de 68 foi de natureza eminentemente comunista, a despeito dos revisionismos picaretas, das mentiras da historiografia oficial e do trabalho de desqualificação de sua importância para a luta de classes empreendido pelo monopólio mundial dos meios de comunicação — inclusive por suas representações no Brasil.

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Já em abril estudantes e trabalhadores franceses
protestavam contra a guerra imperialista no Vietnã

Um trabalho sujo de difamação, feito com a cumplicidade dos oportunistas de plantão. Literalmente de plantão: sempre prontos a atender aos pedidos dos jornais e emissoras de TV para ratificar mentiras, falsificar as memórias e adaptá-las à visão interessante para as classes dirigentes.

Segundo as tentativas de difundir a versão da reação, os acontecimentos do Maio de 68 não passaram de uma rebelião que alterou para sempre a etiqueta burguesa, encabeçada por jovens em busca de liberdade apenas sexual, e ávidos por independência apenas em relação aos seus pais e professores.

Muitas vezes, as páginas publicadas na imprensa ou o tempo de televisão dedicado à memória daqueles acontecimentos se assemelham à cobertura jornalística dos carnavais fora de época dos dias de hoje. Tenta-se apresentar o Maio de 68 como uma baderna bem-vinda à sociedade capitalista, como tumultos desvinculados das questões de classe. Ou seja: algo realizado por anarquistas, existencialistas e libertinos, que deve ser lembrado como um simpático rebuliço comportamental, e nada mais.

Ardilosamente, quando agora se celebram os 40 anos do Maio de 68, a reação tenta minimizar os grandes feitos que os cerca de dez milhões de trabalhadores franceses — dois terços da força de trabalho do país — protagonizaram naquele ano, assim como na época a reação voltou contra o povo toda a fúria do seu ódio de classe, com calúnias, cacetetes e bombas de gás.

Ao mesmo tempo, as falsas memórias denigrem a imagem dos outros protagonistas do Maio, os estudantes. Seus difusores apresentam os combativos e politizados jovens parisienses como românticos ansiosos por reinventar os costumes burgueses, a fim de cair na farra.

Mais do que isso: tentam transformar em mera festa uma revolta de classe, anti-capitalista, e violentamente reprimida pela polícia do general Charles De Gaulle. O general, aliás — e não obstante as mentiras contadas e as verdades sabotadas — foi encurralado pelo povo naquele Maio, obrigado a colocar o rabo entre as pernas, e se esconder em uma base militar alemã.

Indo além, o revisionismo sobre o Maio quer levar a crer que aqueles acontecimentos começaram no dia 1º e se encerram tão logo começou o mês de junho, como se tudo tivesse transcorrido de forma previamente marcada, com início, meio e fim, tal e qual um grande evento da cultura pop. Ilusões bem de acordo com a maneira através das quais os meios de comunicação burgueses desvirtuam o Maio de 68 perante o distinto público.

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Operários da Citröem ocupam fábrica, tomam a frente
e seus portões e exibem cartazes combativos

Longe disso. O que aconteceu em 1968 em Paris, em particular, e em outras partes do mundo, mais do que uma reviravolta comportamental, foi um capítulo no desdobramento do processo revolucionário que se iniciou com a Comuna de Paris, em 1871, que instituiu o primeiro governo operário da história no mesmo palco onde um século mais tarde aconteceria o Maio. Há que se ressaltar que o mundo todo vivia a efervescência da Grande Revolução Cultural Proletária na China, sendo Mao Tsetung muito lembrado nas manifestação de Paris, ao lado dos demais líderes do proletariado internacional.

Um processo que teve no meio do caminho seu acontecimento de viragem histórica que abriu uma nova Era: as vitórias dos operários e camponeses na Rússia revolucionária, na Revolução de Outubro de 1917. Um longo processo de resistência, conquistas e politização das massas.

Mas acima de tudo é um processo revolucionário que persiste, e que transcorre debaixo de nossos olhos, em nosso tempo. Entre vitórias e retrocessos, enfrentando a traição, o oportunismo e a truculência da reação das classes dominantes, o povo trabalhador segue firme no seu ideal de emancipação frente ao capital, com a consciência de seu papel de condutor da humanidade rumo à liberdade.

Maio de 68 contou ainda, em seu epicentro, com a longa história do movimento estudantil na França, que remonta às greves que paralisaram a mesma Universidade de Paris ainda no século XV. Marcou uma luminosa época na qual se criou vínculos entre a universidade e a fábrica. Um legado de suma importância e um exemplo de força, solidariedade e organização para as classes populares dos dias atuais.

Na verdade, naquele Maio, os estudantes da Universidade de Paris e de outras partes do mundo se valeram de um instrumental simbólico inspirado no exemplo das lutas operárias, com manifestações, reuniões e ocupações. Um encontro no tempo e no espaço de duas longas tradições de enfrentamentos em defesa das causas democráticas.

Hugo R C Souza

http://www.anovademocracia.com.br/


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